Obsessão: o noir mal-sucedido de Soderbergh?

 
UMA OBRA SUBESTIMADA
 
Em entrevista à Venice Magazine, em julho de 1998, Steven Soderbergh lamentou que o seu filme "Obsessão" (o título brasileiro para The Underneath, "Subterrâneo", em tradução livre), lançado três anos antes, não tivesse alcançado aquilo que ele intencionava, chegando a qualificá-lo como uma "experiência fracassada". Obviamente o grande filmaker estava sendo injusto consigo próprio. Não obstante não seja o tipo de filme que lhe deixe impressionado por mais que algumas horas, Obsessão é de fato um bom trabalho, com eficiente condução de um enredo complexo e um fantástico uso das cores no sentido de chegar aos resultados que os mestres do cinema noir alcançaram usando o preto e o branco.
 
Inspirado no romance pop Criss Cross, de Don Tracy, publicado em 1934, e  que se transformou em filme de mesmo título, em 1949 (estrelado por Burt Lancaster), o longa apresenta a história de Michael Chambers (Peter Gallagher, o inescrupuloso advogado de Sexo, Mentiras e Videotape), um jogador que teve de fugir de Austin, capital do Texas, por conta de dívidas impagáveis, e retorna anos depois para assistir ao segundo casamento da sua mãe. A volta para casa lhe defrontará com Rachel (Alisson Elliot), sua ex-namorada, abandonada por ele quando da sua fuga, agora envolvida com o perigoso gangster Tommy Dundee (William Fichtner) e com David (Adam Trese), seu psicótico irmão policial. O quarteto se envolve numa trama conduzida fragmentariamente, através de recursos como o flashback, cujo ponto alto é a psicologia dos próprios personagens. Michael, que é ajudado pelo padrasto - que lhe arranja emprego na empresa de transporte de valores na qual ele trabalha - termina por envolver-se (ainda que forçadamente) num assalto à empresa que resulta na morte do novo esposo da sua mãe, mas parece não importar-se muito com isso ou com qualquer outra coisa. As motivações dos demais personagens também são um tanto ambíguas e não à tôa as reviravoltas verificadas na trama são tão surpreendentes.
 
 
Obsessão: o filme "menor" de Soderbergh
 
À época, Obesessão foi criticado como um frio exercício de cineasta e por conta do seu (suposto) formalismo - no sentido da forma sobrepor-se ao conteúdo. Claro que não é bem assim, mas com o time do contra engrossado pelo próprio Soderbergh, ficou difícil defender esta obra "menor" da sua filmografia. Este tipo de crítica é comum em obras das quais se espera muito, mas que terminam por quebrar tal expectativa. Nesse sentido, Obsessão lembra muitos filmes, como Preciosa (Precious, 2009) ou O último Rei da Escócia (The Last King of Scotland, 2006), que em muitos aspectos são grandiosos, mas, no geral, deixam uma sensação de incompletude,
 
Críticas à parte, vale a pena conferir esta obra desprezada, cujo estudo de cores serviu de base para obras futuras de Soderbergh. Se não por conta de estudos acerca da evolução da filmografia do cineasta estadunidense, pelo menos para se deixar levar por este filme conduzido com sensibilidade e talento.
 
 
Gabriel Petter
 

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