Traição em Hong Kong: o Novo Cinema de Ação

Título exemplar do novo cinema policial europeu, Traição em Hong Kong será exibido nessa sexta-feira, dia 11 de abril, na Vila das Artes, como parte da homenagem que o Grupo 24 Quadros presta ao ator Michael Madsen nesse mês de abril. Em texto assinado por Pierre Grangeiro, um pouco mais sobre a obra

Olivier Assayas: novo nome do cinema de ação europeu


Por Pierre Grangeiro

Um curioso thriller de ação. Assim pode ser definido Traição em Hong Kong (Boarding Gate, FRA, 2007), dirigido por Olivier Assayas, um dos mais proeminente diretores do novo cinema francês e ex-crítico da Cahiers du Cinema, que tem no currículo obras tão díspares quanto o seriado Carlos, sobre o famoso terrorista Chacal, até o cultuado Depois de Maio (Aprés Mai, FRA, 2012), que faz uma análise sensível sobre o Maio de 1968.

Um dos filmes menos conhecidos de Assayas, Traição em Hong Kong é uma válida tentativa de injetar um novo frescor a um tipo de cinema explorado à exaustão em Hollywood e que procurava, a todo custo, se reinventar nesse início de milênio. Estamos falando do filme policial, que passou a se destacar enquanto gênero a partir dos anos 1930, com a ascensão do chamado "cinema de gangster." O desenvolvimento desse subgênero chegou ao seu apogeu em meados dos anos 1970, com o surgimento de cineastas extraordinários como William Friedkin (com Operação França), Don Siegel (Perseguidor Implacável)  e o mítico Sam Peckinpah (Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia).

Sendo um produto de fácil assimilação, não foi à toa que diferentes cineastas europeus passaram a explorar esse filão de forma bastante significativa, buscando uma nova forma de tratar o tema, com roteiristas ousados e realizadores competentes, como já havia fora feito com o faroeste, que se modernizou consideravelmente com o western spaghetti.

Um dos produtos dessa nova era, o filme de Assayas pode ser visto principalmente como uma obra de atuação. E por incrível que isso possa parecer, o grande herói dessa jornada não é nenhum detetive ou bandido, mas sim uma ex-prostituta vivida pela sensualíssima e talentosa Asia Argento, filha do lendário Dario Argento, e que já havia brilhado em películas como New Rose Hotel, de Abel Ferrara, e Maria Antonieta, dirigido por Sofia Coppola. Aqui ela domina o filme de tal forma que fica difícil analisar a confusa trama sem enfocar esse papel marcante, que merecia pelo menos uma indicação ao Oscar.

Asia Argento: sexy e talentosa

A primeira parte do filme se passa num curto espaço de tempo em que Sandra (Asia Argento)  reencontra Miles (Michael Madsen), um milionário falido que fora sua grande paixão, quando é chamada a prestar-lhe serviços. Apesar da sua frieza inicial, as feridas sentimentais parecem estar mais expostas do que nunca. O público fica ciente do passado de ambos, marcado por orgias regadas à todos os tipos de drogas e que incluem até casos de estupro. Nesse ponto da estória, sentimos que Miles exercia sobre Sandra um controle tal que ela se dispunha a realizar todos os seus desejos. Envolvida com um chinês casado e tentando incessantemente mudar de vida, Sandra se envolve num jogo perigoso que culmina com o assassinato de Miles. A partir desse fato, o filme recai no clichê hollywoodiano, mas sem diminuir o interesse do público: Sandra passa a ser perseguida tanto pela polícia como pelos mandantes do crime, e a conclusão do longa revela algumas surpresas pouco óbvias e um inevitável olhar europeizante. 

Além da fantástica performance de Argento, que se sobrepõe com uma personagem difícil, exalando ambiguidade, sofrimento e erotismo, o longa tem bons momentos de ação e alguns diálogos instigantes. O ponto fraco do filme fica por conta do roteiro, que apresenta falhas, obscurecendo as motivações da personagem principal. Mas isso não diminui esse trabalho, que possui qualidades acima da média das produções do gênero. No final das contas, o interesse maior para os cinéfilos fica por conta do encontro de uma estrela do pornô soft (Asia Argento) com um ator canastrão cult (Michael Madsen), que brilham nos poucos momentos em que contracenam. E isso já vale para assistir a esse pequeno exemplar do intrigante novo cinema francês.

Traição em Hong Kong será exibido nessa sexta-feira, dia 11 de abril, na Vila das Artes, dentro da programação de abril do Cineclube 24 Quadros.

Comentários

  1. Caro Pierre,
    Como sempre vocês clareando nossas mentes com comentários bastantes pertinentes às obras - no caso, os filmes - apresentadas. Isso nos ajuda a entender o autor, os atores e seus trabalhos.
    Valeu pelo comentário...

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

NOVE E MEIA SEMANAS DE AMOR - Erotismo à lá anos 1980

EU – Walter Hugo Khouri em Grande Estilo

ENTREVISTA - Hanna Korich e Laura Bacellar