INSTINTO SELVAGEM: O EROTISMO SEGUNDO PAUL VERHOEVEN

Não se fazem mais thrillers eróticos como esse. É o que vem à cabeça de quem assistiu à Instinto Selvagem (Basic Instinct, EUA, 1992), o lendário filme que reuniu Sharon Stone e Michael Douglas em atuações muito acima da própria média e que tem a eterna sequência da cruzada de pernas da loira fatal por excelência da boa filmografia comercial estadunidense da década de 1990, em outra das obras-primas pop do holandês Paul Verhoeven. Em texto assinado por Pierre Grangeiro, um pouco desse trabalho que bota bobagens pseudo-eróticas da atualidade no chinelo, e que exibiremos, com todo prazer, nessa sexta, dentro da mostra dedicada aos cult movies da década de 1990, na programação de maio do cineclube 24 Quadros, comemorando seus três anos de atividades ininterruptas

Sharon Stone, como a misteriosa Catherine Tramell: "Ela é má. Ela é um gênio"
 Por Pierre Grangeiro

Uma cena de julgamento. Uma  linda mulher no centro. Um cigarro, perguntas e uma cruzada de pernas. A garota não usa roupas íntimas. Todos olham abismados. O que seria apenas mais uma cena de um filme policial passou para o imaginário coletivo como um dos grandes momentos da história do cinema. Toda a sequência seria banal, se a obra em questão não fosse uma das mais importantes e instigantes do cinema contemporâneo. Instinto Selvagem (Basic Instinct, EUA, 1992) mostrou ao mundo como o cinema de entretenimento pode ser inteligente, criativo e atemporal.

Tendo uma das sequências  iniciais mais chocantes da sétima arte - o famoso assassinato ocorrido durante o ato sexual -, quando uma mulher executa seu amante com um furador de gelo, o longa mostra toda a investigação policial feita para desvendar o(a) autor(a) do crime. Um dos encarregados para esse feito é o detetive alcoolotra Nick Curran, vivido espelndidamente por Michael  Douglas. A maior suspeita do crime é a famosa escritora de romances policiais Catherine Tramell, que passa a envolver o investigador em uma teia de paixão, perigo e muito sexo. 

A trama, passada em San Francisco, vai amadurecendo  até chegar a um clímax, onde vários assassinatos passam a ocorrer de maneira bastante violenta, e outras personagens passam a ser suspeitas de participação nos crimes.  Sharon Stone dá um show a parte no papel mais importante da sua carreira. Sua caracterização como Catherine é digna das maiores femme fatalles que o cinema já viu. Sua personagem amadurece ao longo da película, de uma maneira ambígua e assustadora. Os diálogos entre ela e o detetive são absolutamente inesquecíveis, e atiçam a libido do público, insinuando sexo durante quase todo o longa. Outro destaque é a presença do lesbianismo entre as personagens, o que causou vários protestos da conservadora comunidade gay americana.

O filme tem várias momentos grandiosos e Venhoeven mostra porque é um dos grandes diretores da sétima arte. Além da antológica sequencia  do julgamento, outro momento marcante é o da cena da boate, em que rola todo tipo de orgias e drogas, culminando com a primeira transa de Nick e Catherine. Aliás, todas as  cenas de sexo são bem impactantes, o que causou uma certa censura em alguns paises. A maneira que o diretor cria o clima de suspense é comparável ao melhor Hithcock. O roteiro extraordinário de Joe Eszterhas é outro ponto forte, com destaque para a sequência final a lá Cidadão Kane.

Uma das obras primas de Paul Verhoeven, que já havia brilhado em jóias da filmografia holandesa, como Soldado de Laranja, Louca Paixão e O Quarto Homem, além, é claro, dos hollywoodianos Robocop e O Vingador do Futuro, o filme, ao longo dos anos, virou um paradigma para diversas produções, nem sempre de bom gosto, ao enfatizar o suspense de cunho erótico. E assim como influenciou, o longa teve uma série de referências que não podem deixar de ser elucidadas. As cenas de perseguição e a obsessão da personagem principal pela loira fatal é uma das melhores homenagens já feitas ao Vertigo hithcockiano. Os movimentos de câmera nas cenas de investigação do crime pagam tributo à Marca da Maldade, de Orson Welles. Isso sem falar na belíssima trilha elaborada por Jerry Goldsmith, cuja principal fonte vem de Bernard Hermann. Além, é claro, da atmosfera bem anos 40, que perpassa toda a trama, onde o cinismo e hipocrisia das personagens dominam os relacionamentos,  o que nos remete logo à Pacto de Sangue, o maior filme noir de todos os tempos. Enfim, uma obra fundamental que deve ser apreciada por todos,  e cque sempre será lembrado pela imortal personagem de Catherine Tramell, definida de maneira definitiva pela psicóloga Beth Garden:

“Ela é má. Ela é um Gênio”

Uma ótima sessão para todos.

Comentários

  1. Pierre, valeu o comentário... Apesar de muito comentado, eu ainda não assisti...

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