CIGARETTE BURNS: CERTAS COISAS
A partir de hoje o blog do Grupo 24 Quadros inaugura sua primeira coluna fixa, Cigarette Burns, dedicada a abordar temáticas ligadas ao universo do cinema e do audiovisual com espírito crítico, mas com generosa dose de bom humor
Por Gabriel Petter
Há poucos dias assisti ao primeiro filme de Brian de Palma, Greetings, lançado em 1968. Pela primeira vez um filme conseguiu provocar uma crise de riso desesperado em mim. Os 89 minutos do longa estenderam-se por uma eternidade, marcada por uma direção caótica, atuações que beiram o amadorismo (apesar do bom elenco), um roteiro sem pé nem cabeça e situações que, de tão absurdas, deveriam ser engraçadas - não são. Mas a produção B de De Palma e cia. é o de menos. Pode-se muito bem passar sem ela. Ninguém é obrigado a assistí-la e ainda há o desconto da mesma ser uma obra histórica, um filme (ruim) de início de carreira de um futuro bom diretor e de um futuro excepcional ator - Robert de Niro. O mais grave é perceber como certas idiotices costumam fazer escola, não obstante a reação (sábia) do público de esvaziar as salas de exibição quando em confronto com elas.
Brian de Palma: o diretor de um dos piores filmes de todos os tempos
Certas coisas são inexplicáveis no mundo do cinema. Uma delas é a persistência de alguns realizadores em tentar transformar a produção de um filme num exercício de arte conceitual - e ainda lutar para convencer o público de que vale a pena gastar algumas horas da sua vida assistindo a um troço intelectualóide que só faz sentido na cabeça de quem o produziu. Tal empenho em tirar o cinema da esfera do entretenimento para o campo do pensamento equivale a um atestado de fracasso prévio perante quem realmente mantém, desde sempre, a sobrevivência da chamada sétima arte. É difícil (quase impossível) assistir à boa parte da filmografia de "intelectuais do cinema", como Jean-Luc Godard - no qual o De Palma debutante no mundo do cinema claramente se inspirou - ou do incensado Glauber Rocha, por exemplo, sem uma latente perturbação, que não é provocada (como petulantemente se supõe) pela pura falta de preparo do público para apreciá-la, mas porque é difícil mesmo engolir películas mal-feitas, que, de tão confusas e desconexas, são classificadas como experimentais - na falta de um termo melhor para filmes espanta-público. E o mais engraçado, para não dizer nauseante, é que boa parte da meninada que se enfurna nas escolas de cinema Brasil afora é ensinada a agir de maneira semelhante aos "cineastas-intelectuais", ou seja, a fazer filmes para si próprios (para os amigos também, vá lá!) e cuja compreensão só pode se dar mediante a explanação de algum "iniciado" na obra.
Claro que, no andar dessa carruagem, estamos formando futuros re-criadores da roda, narcisistas e ignorantes acerca do caráter primordialmente industrial do cinema ou mesmo do sentido da experimentação, que nada tem a ver com a criação de trabalhos herméticos e tediosos. Ou seja, futuros esvaziadores de salas de exibição e pedintes de esmolas ao Estado, afinal, o único agente com capital disponível para jogar no lixo. Produtores de respeito jamais se arriscarão financiando bombas que dizem ao que vieram desde a elaboração dos seus projetos, recheados de citações e referências de autores consagrados, mas absolutamente vazios quando a questão previsão de público e renda vem à tona.
Entretanto, há quem acredite que este ainda é um caminho para formar um "novo público" e resguardar o "cineasta autoral" da voracidade do sistema, embora ambos, no mundo do cinema de verdade, sejam como a Associação das Harpistas Profissionais ou o clube das bruxas (perdão às harpistas profissionais e/ou bruxas), isto é, pequeno, obscuro e ignorado pela grande maioria das pessoas, embora consigam sobreviver às custas de financiamento público a fundo perdido e da tinta que acadêmicos que nunca pisaram num set de filmagem gastam elogiando coisas que só podem ser toleradas mesmo no mundo das idéias. E haja Greetings para serem heroicamente assistidos por uma platéia (mínima) que resiste bravamente ao desejo de não gostar dessas porcarias e correr atrás do primeiro blockbuster que aparecer na sua frente.
Entretanto, há quem acredite que este ainda é um caminho para formar um "novo público" e resguardar o "cineasta autoral" da voracidade do sistema, embora ambos, no mundo do cinema de verdade, sejam como a Associação das Harpistas Profissionais ou o clube das bruxas (perdão às harpistas profissionais e/ou bruxas), isto é, pequeno, obscuro e ignorado pela grande maioria das pessoas, embora consigam sobreviver às custas de financiamento público a fundo perdido e da tinta que acadêmicos que nunca pisaram num set de filmagem gastam elogiando coisas que só podem ser toleradas mesmo no mundo das idéias. E haja Greetings para serem heroicamente assistidos por uma platéia (mínima) que resiste bravamente ao desejo de não gostar dessas porcarias e correr atrás do primeiro blockbuster que aparecer na sua frente.
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