O ATAQUE DOS TOMATES ASSASSINOS: UM FILME RUIM À PROCURA DE UM BOM DIRETOR
A genialidade demanda tempo (um determinado tempo) para
ser reconhecida e só pode ser compreendida enquanto tal quando há termos de
comparação suficientes para não deixar margem de dúvidas em relação ao seu
caráter singular. No mundo da cinematografia trash, o gênio de um Ed Wood fica muito evidente pela maneira como
os seus trabalhos, sobretudo sua obra-prima, Plano 9 do Espaço Sideral (Plan
nine from outer space, EUA, 1958), apresentam uma unidade que conquista a
atenção e o interesse do espectador, não obstante os inumeráveis defeitos
(mesmo?) que tornaram-no, injustamente, conhecido como um dos piores filmes de
todos os tempos. Tal substância resulta de uma fórmula de elementos
relativamente simples, mas cada dia mais escassos no mundo do cinema:
criatividade, espontaneidade e... amor.
John de Bello: o diretor de O Ataque dos Tomates Assassinos
Digo e repito: é preciso ser bom para
fazer um bom filme ruim. Quer a prova? Confronte Plano 9 do Espaço Sideral com O
Ataque dos Tomates Assassinos (The Attack of the Killer Tomatoes, EUA, 1978).
Não obstante seja um marco na cinematografia trash, o seminal filme de John de Bello não trái a unidade de uma
obra pensada como um todo – mesmo que apenas para provocar o riso apoplético no
público. Explica-se: enquanto em Plano 9, apesar de todos os senões, percebe-se
um fio conduzindo a estória -- a mão invisível do diretor, em O Ataque dos Tomates Assassinos não é possível
detectar uma linha narrativa precisa. Isso também se explica: o deboche permeia
todo o filme, que custou módicos U$$ 90 mil e que, além das limitações
técnicas, contava com um elenco que parecia mais preocupado em forçar piadas do
que dar algum ar de verossimilhança à “obra”. Se em plano 9 o riso é tão
espontâneo quanto o absurdo da estória e das atuações, em O Ataque dos Tomates
Assassinos vira um forçar de barra que beira a comédia pastelão, o que não é
ruim, se houvesse alguém mais talentoso conduzindo todos os elementos da trama.
Mas John de Bello não é propriamente
um homem de cinema, como Ed sempre foi. Antes de levar ao mundo seu hit trash, não passava de um desconhecido
com algumas pontas em produções menores. Tanto que, observada a sua
filmografia, a mesma praticamente se reduz à quadrilogia dos tomates assassinos
e, atualmente, ele trabalha como diretor de criação de uma empresa de
comunicação. Ed não era apenas um homem de cinema, mas um ser humano cuja vida,
permeada por absurdos, se confundia com as (boas) loucuras que ele levava às
telas. Daí a honestidade, muitas vezes risível, algumas vezes comovente, de
filmes como Plano 9 do Espaço Sideral – aliás, em determinados aspectos
técnicos, como a fotografia, anos-luz superior à O Ataque dos Tomates
Assassinos – e outros trabalhos que, acidentalmente, revelam perspectivas
insuspeitadas em relação à arte e (porquê não?) à própria vida. E nada disso é possível
sem um profundo amor ao que se faz e, nesse sentido, mestres como Ed Wood
merecem todo o respeito do mundo.
Obviamente, isso não desmerece o
Ataque dos Tomates Assassinos, uma das películas mais representativos do (sub)
gênero “terrir”, que tem momentos bastante engraçados e que, sem dúvida,
inspirou dezenas de bombas semelhantes. Mas, é forçoso reconhecer, em mãos mais
habilidosas, o longa teria rendido como contas em paraísos fiscais, o que
ratifica outra verdade em relação à cinematografia trash: é, sim, possível fazer um bom filme ruim. Mas não é qualquer
um que tem peito e nem talento pra tanto.
Gabriel Petter
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