Qual é o problema, afinal: Cinema Industrial ou Cinema Industrializado?

Em recente entrevista, Marcos Prado, celebrado produtor da sequência Tropa de Elite e diretor do longa Paraísos Artificiais, reclamou dos gargalos que impedem (do seu ponto de vista) o desenvolvimento do cinema nacional, destacando os limites impostos pela ANCINE para a captação de recursos, a falta de uma estratégia de  marketing internacional e de incentivo governamental. Na sua opinião, o cinema nacional precisa se industrializar. Por outro lado, a renda gerada por produções made in Brazil cresce a cada ano, impulsionadas especialmente pelos lançamentos com o selo Globo Filmes, numa estrutura que não fica a dever aos mais especializados (industrializados) centros de produção internacional.
 
Sobre que problema falamos, afinal, quando abordamos a relação cinema X indústria? Para quem conhece os meandros do mundo cinematográfico nacional, é fato que produzir filmes no Brasil é um risco, até mesmo de falência empresarial. Entretanto, é mister entender a questão antes de advogar pelo diabo errado. Ora, não é preciso ser um produtor tarimbado para saber que, não obstante a abundância de dólares disponível no mercado audiovisual norte-americano, quase não há autonomia possível mesmo para quem (teoricamente) lidera o processo criativo. São lendárias as pendengas em que diretores célebres como Alfred Hitchcock se meteram quando trabalharam em Hollywood e essa situação não se alterou substancialmente por conta de uma razão consagrada naquele meio: filmes precisam ser lucrativos. Têm que gerar renda, pois uma produção ainda é cara, não obstante o barateamento das tecnologias de captação.
 
Isso não quer dizer que produções industriais precisam ser necessariamente ruins e o próprio cinema americano é um pródigo fornecedor de excelentes blockbusters. Ocorre que os realizadores brasileiros ainda não se deram conta de que é possível, sim, realizar uma grande obra com grande investimento. Preferem, ou transpor a fórmula da telenovela para as salas escuras - às vezes quase como se exibissem um capítulo de duas horas em película - ou trilhar o caminho de um cinema "autoral" para poucos e com inevitável prejuízo financeiro. Por outro lado, é evidente que o incentivo governamental deve existir, mas deveria não centrar-se apenas na realização, quase sempre privilegiando os poucos apaniguados que podem dispor de recursos públicos para suas produções, pensando numa estratégia integrada que incentive o empreendedorismo em cadeia e acabe com a cultura do "pires na mão", que muitas vezes desperdiça dinheiro público e faz a festa de picaretas que se dizem cineastas.
 
Além disso, é possível também fazer um bom filme sem gastos astronômicos, evidentemente a depender do talento e do bom senso dos realizadores. Afinal, os expectadores, que cada dia vão menos ao cinema, não investem seu suado dinheirinho para assistir a coisas chatas e incompreensíveis. Fazer um bom filme autoral não significa que o mesmo deva ser hermético. Por outro lado, utilizar com propriedade as regras já assimiladas pelo público para levar uma produção para mais pessoas é um caminho viável tanto para os custos de produção como para a projeção do cineasta perante o público.
 
O seja, a relação cinema X indústria no Brasil é problemática e não implica uma questão puramente econômica. Há dinheiro, profissionais e algumas estruturas de produção muito desenvolvidas, sobretudo no campo da dramaturgia televisiva. A questão fundamental reside entre a opção entre modelos de produção: cinema industrial ou cinema industrializado? Pode parecer redundante, mas, para quem já cansou de ler, ouvir e comentar discussões a respeito, ela faz todo o sentido.
 


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