Sobre a mostra Steven Soderbergh: entrevista com o curador

Gabriel Petter, curador da mostra dedicada ao cineasta norte-americano Steven Soderbergh, e um dos membros fundadores do Grupo XXIV Quadros, que realiza a mostra, fala para o blog do grupo sobre o evento do mês de março.
 
 
 
Foto: Divulgação
 
XXIV Quadros: Por que escolher Steven Soderbergh para realizar a mostra do mês de março?
 
G. P.: Acho que é uma questão de afinidade. O primeiro filme de Soderbergh a que eu assisti foi o Full Frontal, naquelas (boas) sessões da madrugada que passavam na TV Globo. Foi paixão à primeira vista. Só bem depois, de uns anos para cá, é que eu conheci melhor seu trabalho e percebi que o mesmo merecia ser mais divulgado, como o de qualquer grande mestre do cinema mundial. Acho importante também que as pessoas conheçam um Steven que vai além dos "Doze Homens e um Segredo" ou do oscarizado "Traffic", o qual, por sinal, também exibiremos na mostra.
 
XXIV Quadros: O que caracteriza o cinema de Soderbergh e o distingue entre os demais realizadores?
 
G.P.: É difícil responder imediatamente, mesmo porque raramente os cineastas possuem uma obra regular. Dentre as características que me chamam a atenção, posso destacar a velocidade da sucessão dos planos (em alguns filmes), típico de quem, como Soderbergh, trabalhou com vídeos musicais, o roteiro inteligente e o enredo fragmentário. Nesse sentido, boa parte da sua filmografia é bem pós-moderna.
 
XXIV Quadros: Sexo, Mentiras e Videotape é sempre lembrado como um filme independente que cumpriu uma trajetória brilhante no exterior e, de certa forma, abriu as portas para produções de baixo orçamento, porém dirigidas com talento. Na sua opinião, isso pode servir de exemplo para iniciativas desse tipo no Brasil?
 
G.P.: Essa é uma velha querela minha. Sexo, Mentiras e Videotape lembra muito o Indomável Sonhadora, filme independente que concorreu ao Oscar na semana passada e injustamente não ganhou nenhuma estatueta. Quero dizer com isso que não é preciso uma quantia exorbitante ou um elenco estrelar para realizar um bom filme. Acho que os grandes artistas são aqueles que sabem trabalhar com o que têm. Por outro lado, é mister reconhecer que realizar um filme com U$$ 1,8 milhões nos Estados Unidos, que têm dezoito mil  salas de cinema, equipamentos baratos, uma população majoritariamente de classe média e uma boa penetração no mercado internacional, não é a mesma coisa de realizar um filme com essa mesma quantia no Brasil, onde o processo é bem mais caro e onde a maioria da população vive com um salário de fome. Infelizmente, o que chamamos de filme independente remete muito à situação específica do mercado norte-americano, o que não quer dizer que seja impossível realizar um bom trabalho sem muito dinheiro em nosso país. Basta lembrar o caso do maravilhoso documentário "Dzi Croquettes", que a rigor (antes de ser apoiado pela Globo) foi filmado quase sem dinheiro, ou o fantástico "A hora da Estrela", de Suzana Amaral, que custou módicos U$$ 150 mil, uma quantia absurdamente baixa até para sua época (1985) e para os nossos padrões de produção. Claro, o ideal seria que tivéssemos condições para realizar sempre grandes produções, mas os ideais só servem para nos mostrar que a realidade é sempre um pouco pior do que imaginamos.

O que o público pode esperar da mostra?

A continuidade daquilo que o grupo vem realizando nos últimos meses, ou seja, conhecer melhor a obra de cineastas não tão acessíveis ao grande público. Fiquei feliz com a boa afluência de pessoas para as mostras dedicadas a David Cronenberg e Fritz Lang, incluindo muitos jovens, o que é um bom sinal de que ainda haverão pessoas que não estarão dispostas a engolir blockbusters mal-feitos ou telenovelas de longa-metragem no espaço maravilhoso do cinema.

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